Eduardo Ledsham fala com exclusividade à Revista Mineração sobre o aumento na escala do projeto, que envolve mina, ferrovia e porto.

Na primeira quinzena de setembro, a mineradora Bamin atualizou os valores de seus investimentos na Bahia, ampliando os números para R$ 20 bilhões, com a meta de produção passando de 18 milhões de toneladas/ano para 26 milhões. A empresa é responsável pela Mina Pedra de Ferro em Caetité, e também executora das obras do Porto Sul, em Ilhéus, e a da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) Trecho 1, que ligará Caetité a Ilhéus, com 537 km de extensão.

Em entrevista exclusiva à Revista Mineração & Sustentabilidade, durante a Exposibram 2022, o CEO da Bamin, Eduardo Ledsham esclareceu os motivos que levaram a empresa a aumentar os investimentos. O executivo também atualizou o andamento das obras do porto e da Fiol, defendeu a sustentabilidade do projeto e o desenvolvimento da região que está recebendo o conjunto de obras. Confira!

Revista Mineração & Sustentabilidade – Em relação aos investimentos da mineradora na Bahia, houve um aumento significativo nos valores. O que motivou a Bamin a ampliar os investimentos?

Eduardo Ledsham – Atualizamos a escala do projeto, pulamos de 18 milhões de toneladas/ano para 26 milhões/ano. Esse investimento de R$ 20 bilhões inclui mina, ferrovia e porto, sendo 50% mina, 25% ferrovia e 25% porto. A motivação em aumentar os investimentos foi que o nosso produto teve uma altíssima aceitação na indústria siderúrgica da Ásia, Europa e Oriente Médio, onde a demanda do nosso produto poderia chegar a 40 milhões de toneladas/ano. Então, buscamos um ótimo ponto para começar a operação, de 26 milhões. A ferrovia foi desenhada para chegar a 60 milhões de toneladas/ano de capacidade, o porto está desenhado para chegar a 40 milhões de toneladas, então tem espaço na logística e o mercado absorve com tranquilidade esse aumento no projeto.

RM&S Quando o projeto deve ser concluído? O projeto tem margem para ampliar?

Ledsham – O intuito é concluir no final de 2026. Tem sim capacidade de ampliar, temos um corredor que vai abrir oportunidade para outras cargas, então, num futuro próximo, quando conectar com trecho 2 da Fiol, em Barreiras (BA), com uma capacidade de absorver 7 milhões e meio de grãos atuais, esse número pode chegar a 12 milhões saindo pelo mesmo porto. Então, a nossa ideia é ter um terminal dedicado a grãos e manter o Porto Sul com a alternativa de minério de ferro premium.

RM&S Qual o andamento das obras da Fiol atualmente?

Ledsham – Hoje o trecho entre Caetité e Ilhéus, que é o que a gente venceu a concessão, tem 72% já concluído, dos 537 quilômetros. Dividindo isso em 4 lotes, o lote 1, que está perto de Ilhéus é o que está menos avançado, tem 40%, o lote 2 tem 72%, o lote 3, 100% e o lote 4, 85% concluído.

RM&S E as obras do porto, como estão?

Ledsham – As obras do porto iniciaram em julho do ano passado. Hoje, nós temos 550 pessoas trabalhando nas obras e, também, na operação da Mina Pedra de Ferro, que está produzindo o equivalente a 1 milhão de toneladas/ano, que é o limite da nossa licença. Já até entramos com o pedido para aumentar a produção.

RM&S Como é o minério premium da Bamin? Quais vantagens e benefícios ele oferece ao mercado?

Ledsham – O minério premium tem um teor de ferro acima de 65%, o nosso chega entre 67% e 68,5%. Além do alto teor de ferro, ele tem que ter 3 componentes: sílica baixo, fósforo baixo e alumínio baixo, o nosso minério produz um dos alumínios mais baixos do mundo. Se você comparar com outras minas do mundo, as que têm baixo alumínio, elas estão exaurindo, é uma outra vantagem que a gente tem. Então, o premium é a combinação do baixo contaminante e alto conteúdo de ferro.

A vantagem para a siderurgia é que ela vai usar menos carvão, ou seja, menos emissão de CO2 no processo. Com isso, conseguimos atender uma demanda da China, de reduzir a zero a emissão de carbono em 2030. É uma meta agressiva, mas é uma política do governo chinês, maior produtor mundial de aço e consumidor de minério de ferro. Isso já acontece na Europa, Japão e Coreia.

A substituição dos fornos convencionais por fornos elétricos, uma geração que está vindo com a descarbonização e hidrogênio verde, já está acontecendo. Com isso, as siderurgias buscam um aço com selo verde, onde vai exigir esse minério high premium e estável. Esse é o nicho que a gente está entrando, a Bamin vai oferecer para o mercado um produto que atende essa função de descarbonização.

RM&S Em relação ao projeto greenfield, quais os desafios e oportunidades encontrados até agora?

Ledsham – Ele já não é mais greenfield. Com 72% da ferrovia pronta e uma mina já operando em milhão, não dá para chamar mais de greenfield. O porto é mais greenfield, começamos as operações no ano passado, então, eu brinco que ele é um “grãofield”, um milhão a gente já escoa hoje por ferrovia, tanto para o Norte quanto para o Sul. Uma ferrovia operada pela VLI, que tem uma capacidade de 2 a 3 milhões, que traz lições que vamos utilizar para um projeto maior.

A vantagem competitiva dele é o custo e qualidade, nosso minério é um minério muito soft, ele não precisa de grande volume de detonação, o processo de concentração dele é muito simples, exige menos energia, menos consumo de reagente, o que resulta em uma competitividade muito grande de custo. A nossa ferrovia trabalha em declive, devemos estar na cota de mais ou menos 920 metros. Então, podemos chegar ao mar em um declive onde estará consumindo menos energia no transporte. No futuro quem tiver uma locomotiva elétrica, à bateria, estará gerando energia. Já existe, operando no Brasil, o caminhão elétrico, de 72 toneladas, e também a locomotiva elétrica, ou seja, isso já é uma realidade que não tem volta.

RM&S É possível que utilizem uma locomotiva elétrica?

Ledsham – Não no curto prazo, porque a gente precisa garantir a estabilidade da operação e começar. Mas certamente, nas renovações de frota, tanto de material rodante, quanto da mina, vai ser um caminho natural.

RM&S O que pode ser destacado na sustentabilidade da operação, desde a mina até o porto?

Ledsham – Em toda a cadeia, vamos utilizar energia renovável, nós estamos no meio de um parque, com 2.200 torres eólicas. O primeiro passo é fazer parcerias ou PPAs com os fornecedores, mas quem sabe um dia viramos o gerador próprio. O segundo ponto é a recirculação de água, que atinge 93%. Substituímos o transporte rodoviário por ferroviário, mais um selo verde. E a natureza do nosso produto é aquilo que o mercado espera na linha da descarbonização, então, a gente tem aí os 3 pilares que garantem essa sustentabilidade.

Além disso, é uma oportunidade de investir localmente, temos uma meta de trabalhar com pelo menos 70% de mão de obra própria, hoje temos 78%. São 1.580 pessoas trabalhando, tanto na mina em Caetité, na operação, quanto no porto em Ilhéus (BA). E o legado que queremos deixar é: não somos só geração de emprego, também somos conhecimento, tecnologia e prosperidade. Vai muito além, então, essa formação de mão-de-obra vai se replicar para outros projetos, que vão nascer ao longo da ferrovia, ou nas ramificações, viabilizando projetos que estão um pouco mais distantes.

RM&S Qual a previsão de geração de empregos?

Ledsham – Durante a construção, aí estamos falando de diretos e indiretos, são 55 mil empregos. Durante a operação do projeto serão 2 mil empregos diretos e de 8 a 10 mil indiretos.

RM&S Como tem sido o relacionamento com as comunidades?

Ledsham – A gente já vem fazendo isso desde 2012, quando começou o licenciamento, nas audiências públicas, para dar transparência. É importante a gente demonstrar todo esse esforço que está sendo feito para garantir, não só seguir o que é exigido pelo licenciamento, mas ir além disso.

Nós temos vários programas nas comunidades. Em Ilhéus somos uma das poucas empresas, antes da implantação, a assinar um termo de conduta socioambiental, com investimento em uma fundação que vai monitorar todo o trabalho no porto, sendo eles: técnicos, biólogos e engenheiros. Além disso, em paralelo, nós temos um trabalho com a comunidade pesqueira, que já está se desenvolvendo, dando transparência ao que está sendo feito.

Na Fiol, assinada em setembro de 2021, temos um outro projeto social que abrange os 22 municípios que a ferrovia corta. Já em Caetité, iniciamos um programa de desenvolvimento, através de uma agência de geração de novos negócios não ligados à mineração. Nossa meta é deixar um legado que vai além da mineração, mapear e alavancar o desenvolvimento da região, independente da mineração.

RM&S Uma das expectativas da Fiol era que pudesse viabilizar outros projetos ao longo do trecho onde ela vai passar. Isso já começou a acontecer?

Ledsham – Já temos visibilidade de outros mineradores, com anúncios recentes de descobertas de novas fronteiras, próximos à Fiol, na região de Brumado. Existem também projetos menores, com esse minério deles sendo transportado no frete de retorno, para assim beneficiarmos na nossa planta. Tem ainda vários projetos com capacidade menor de produção que podem ser escoados pela ferrovia. Então, o potencial mineral do estado da Bahia é enorme e vai crescer ainda mais.

RM&S No geral, como você avalia a expectativa de desenvolvimento da região?

Ledsham – Se você olhar os IDHs dos municípios mineiros, estão entre os maiores IDHs que se tem no Brasil. Então, o benefício que a gente vai trazer para esse corredor é colocar esses municípios num patamar bem mais alto do que é hoje.

A geração de impostos com o CFEM, estamos falando aí de 3,5%, são impostos além dos impostos formais do ICMS, que se está gerando na economia local. Isso traz um retorno não só para o município onde está a mina, mas também aos que são impactados pela ferrovia. Então, parte dessa receita é dividida entre estado, União e município.

Lá é uma região que tem um IDH baixo, por isso é um projeto transformador. Tem uma expectativa muito grande nos municípios, como por exemplo, Ilhéus, que já foi uma referência, passou pelo alto pico do cacau, entrou num ciclo de baixa, e está retomando. Ao redor do porto existe uma ZPE, que vai trazer outros benefícios, sendo coordenados pelo governo do estado, então, imagino o tanto de novos negócios que podem ser incorporados.

RM&S Sobre a PPI das ferrovias, a Bamin venceu um dos primeiros trechos a serem leiloados. O programa é um caminho sem volta para o país?

Ledsham – Com certeza, já são quase 100 autorizações. A matriz hoje é extremamente dependente da rodoviária, ela vai sempre existir, mas a capacidade que você tem de alavancar o agro, que é o principal negócio nosso, o maior gargalo é a logística. Então, se você vê os corredores tanto para Norte, tanto para Oeste, já são uma realidade. Não tem como você crescer sem logística, e a ferrovia é a única que traz a vantagem competitiva de escala, com baixo custo e menor impacto ambiental.

 

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