Há 40 dos 75 anos da Vale, a empresa conta com um braço social em todas as localidades onde atua no país, a Fundação Vale, cujo trabalho é detalhado nas páginas a seguir por Isis Pagy, diretora-presidente da entidade.

Há mais de quatro décadas, a Fundação Vale atua nos locais onde a Vale opera, contribuindo para o desenvolvimento da região e das comunidades nela inseridas, por meio de ações que se amparam nos pilares da educação, da saúde e da geração de trabalho e renda. Além disso, conforme destaca na entrevista a seguir a diretora-presidente da fundação, Isis Pagy, a instituição implementa tecnologias sociais aderentes às realidades locais com base nas demandas específicas de cada comunidade, reconhecendo os saberes locais e estimulando o protagonismo delas. Segundo Pagy, só em 2016, a Vale doou US$ 16 milhões para a fundação. Mas ela salienta que “o investimento anual da empresa varia de acordo com a necessidade dos territórios e, naturalmente, reflete o momento econômico da Vale”.

 

Mineração & Sustentabilidade: A Fundação Vale atua em três áreas, além de desenvolver ações socioculturais. O que se destaca em cada uma delas?

Isis Pagy: A atuação da Fundação Vale tem como base a política de atuação social da Vale, cujos pilares são educação, saúde e geração de trabalho e renda. De forma complementar, a fundação desenvolve ações sociais nas áreas de esporte, cultura, promoção e proteção social, temáticas que são consideradas transversais. As iniciativas da Fundação Vale têm como premissas o fortalecimento das políticas públicas e o empoderamento das comunidades e, como objetivo final, o desenvolvimento sustentável dos territórios onde são realizadas. Elas são executadas de modo que as comunidades possam se apropriar das tecnologias sociais implantadas e, depois, de sua continuidade, de maneira independente. Isso possibilita que o ciclo de desenvolvimento gerado pela atividade mineradora e apoiado pela Fundação Vale seja sustentável e se perpetue.

Os destaques de cada pilar de atuação:

Saúde – Só em 2016, o programa Ciclo Saúde, iniciativa que busca cooperar tecnicamente com o fortalecimento da atenção básica nos municípios por meio da formação continuada de comunidades e equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF) em temas relacionados à prevenção e à promoção da saúde, beneficiou 1.449 profissionais de saúde e lideranças comunitárias. Outro programa de saúde que podemos destacar é o Casa Saudável, projeto de promoção da saúde que visa disponibilizar o acesso a fontes de água e de alimentos e a instalações sanitárias por meio da implantação de tecnologias sociais simples e de fácil replicação, construídas pelos próprios moradores após participação em oficinas teóricas e práticas, sob a orientação de educadores sociais. Só em 2016, 250 famílias de quatro municípios maranhenses foram beneficiadas.

Educação – O projeto de educação infantil busca ampliar as possibilidades do trabalho educativo e pedagógico ao promover formações para os profissionais e contribuir para a estruturação de espaços educativos, enviando equipamentos e recursos didáticos considerados pressupostos para o desenvolvimento desse segmento. Em Rio Piracicaba (MG), foram contemplados 135 professores, gestores e auxiliares de educação infantil. Além disso, foram estruturados espaços para 81 educadores e 527 crianças. Ao todo, mais de 950 alunos se beneficiaram com a formação de profissionais.

Geração de Trabalho e Renda – Só em 2016, o programa de Apoio à Geração e Incremento de Renda (Agir) beneficiou diretamente 1.125 empreendedores, capacitando 663 empreendedores, com a elaboração de 106 planos de negócio e 81 negócios sociais incubados ou acelerados por meio de investimento direto (capital semente) e da mentoria em eixos do negócio, tais como governança, gestão financeira, processo produtivo, comercialização e capital humano.

M&S   São quatro décadas investindo em tecnologia social. O que esse tempo significa? De qual forma, por meio da fundação, a Vale mudou a realidade das comunidades onde está inserida?

Isis  O trabalho da Fundação Vale contribui para a melhoria de vida das comunidades por meio do desenvolvimento e da implementação de tecnologias sociais aderentes às realidades locais, com base nas demandas específicas de cada comunidade, reconhecendo os saberes locais e estimulando o protagonismo delas.

M&S   A Vale completa 75 anos, ao passo que a fundação tem pouco mais de 40. Por que a empresa sentiu a necessidade de criar um braço social para suas atividades?

Isis  Criada em 1968, a Fundação Vale do Rio Doce de Habitação e Desenvolvimento Social, primeiro nome da Fundação Vale, desenvolvia projetos habitacionais para empregados da Vale nas regiões onde a então Companhia Vale do Rio Doce atuava. Em 1998, portanto, logo após o processo de privatização da empresa, a Fundação Vale foi além, assumindo a tarefa de realizar o investimento social da Vale. Essa mudança foi necessária, pois a Vale reconheceu a necessidade de dar mais efetividade à aplicação dos investimentos sociais da empresa através de projetos estruturantes e com equipe especializada e dedicada a esse desafio.

M&S   Qual balanço a senhora faz da história da Vale, de sua evolução e de seu relacionamento com a sociedade?

Isis  Na perspectiva social, a Vale vem num trabalho de constante aprimoramento de sua atuação e, para isso, conta com a Fundação Vale. Na perspectiva do relacionamento com a sociedade, é necessário, primeiramente, reconhecer os contextos locais, bem como a existência de políticas públicas que estabelecem papéis e responsabilidades. A Vale, nesse ambiente, busca contribuir para o desenvolvimento local e valorizar o protagonismo dos demais atores do território. Parte, portanto, da premissa de que o desenvolvimento do território não é tarefa que possa ser realizada de forma isolada, por um único ator, sendo necessários o engajamento dos setores público e privado e a participação social da população local. Assim, considera o diálogo intersetorial e a construção coletiva essenciais para promover um modelo de desenvolvimento que responda às necessidades econômicas, sociais, ambientais e culturais da região.

M&S   Atualmente, a Vale é uma das maiores mineradoras do mundo e sempre inovou em seus processos produtivos. A inovação também esteve presente na preocupação com ações sociais? Por quê?

Isis  Sim. Inovação é a atuação embasada no conceito estratégico de Parceria Social Público-Privada (PSPP), na qual a Fundação Vale é pioneira. A PSPP se refere a uma estratégia de investimento social que pressupõe a união de esforços, recursos e conhecimento da sociedade civil, governos e empresas em torno de uma agenda comum. Essa agenda é construída com ações que contribuem para a promoção da qualidade de vida e do desenvolvimento humano; o fortalecimento da intersetorialidade e das políticas públicas; a ampliação da participação democrática na perspectiva da inclusão cidadã; a efetividade dos investimentos sociais do setor privado; a construção coletiva e a figura do cidadão enquanto beneficiário e copartícipe do processo de desenvolvimento territorial simultaneamente. Entendemos que nossa experiência pode inspirar outros setores. Estamos convencidos de que esta estratégia de cooperação construída no território aprimora o planejamento e os resultados dos investimentos sociais privados nos municípios onde a empresa atua à medida que fortalece a articulação com as políticas públicas, facilita o mapeamento mais estratégico de parceiros locais, promove a otimização dos recursos mobilizados e viabiliza o monitoramento dos impactos nos processos socioambientais, econômicos, culturais e políticos da região. Como nosso principal desafio fica a pretensão de extrair dessa experiência a consolidação de um instrumento de inovação e de coordenação, que acreditamos ser vital para potencializar o desenvolvimento do território.

M&S   A mineração traz um estigma de problema para as comunidades onde está inserida, por conta dos impactos que provoca na região e nos povoados. Como a Fundação Vale atua para vencer essa dificuldade e mudar essa percepção?

Isis  A presença de um empreendimento da mineração provoca um grande crescimento econômico. Isso atrai a população pelas oportunidades de trabalho. Essa pressão demográfica vai demandar mais serviços e mais infraestrutura, recaindo no poder público e na própria empresa. Isso pode ser um ciclo vicioso ou um ciclo virtuoso – uma oportunidade ou uma ameaça. É muito importante que o investimento social privado, as ações sociais, ambientais e culturais, em prol do bem comum, os tributos e a compensação pela exploração mineral consigam convergir e ser trabalhadas num propósito único de desenvolvimento.

É nesse sentido que a mineração pode deixar um legado de desenvolvimento nas cidades. Um exemplo disso é o Projeto de Ferro S11D, o maior da indústria da mineração, desenvolvido pela Vale no município de Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará. A cidade nasceu na década de 1990 de um assentamento rural. Em 15 anos, triplicou de tamanho por conta do próprio processo de exploração mineral. Canaã dos Carajás pode ser considerada um caso de sucesso na história da mineração. Em primeiro lugar, porque houve a possibilidade de os setores privado e público trabalharem de forma integrada. Isso foi capaz de promover crescimento econômico e desenvolvimento para a cidade. Essa articulação aconteceu através dos instrumentos de gestão pública, planos municipais de educação, saúde, saneamento, mobilidade urbana e do próprio plano diretor. Dessa união, surgiu a oportunidade de construir metas comuns para se desdobrarem em ações estratégicas complementares, trazendo um investimento social, público e privado, para o desenvolvimento dessa cidade.

Os resultados alcançados foram bastante expressivos. Na educação, por exemplo, a Secretaria Municipal de Educação de Canaã e a Fundação Vale instituíram o Pacto pela Educação no município de Carajás. As metas do plano nacional foram cumpridas, e, além disso, houve um engajamento dos pais para que pudessem participar da rotina escolar. Na saúde, os desafios foram enormes. Canaã saiu de 53% de cobertura da atenção básica em 2009 para 100% de cobertura em 2015. Outro ponto determinante para o desenvolvimento da cidade foi identificar outras vocações além da mineração. Um exemplo é o turismo que a região tem. O próprio projeto S11D é importante para que Canaã consiga se repensar após a mineração. Ele precisou ser visto e ser construído à luz dos aspectos da sustentabilidade e, por isso, faz Canaã a se repensar e fortalecer outras vocações econômicas além da mineração. Um aspecto fundamental para o desenvolvimento da cidade é a participação da comunidade. Nesse sentido, houve um esforço da iniciativa privada e do poder público de propiciar, principalmente para os jovens, a oportunidade de se engajarem no processo de desenvolvimento. Uma das atividades consistiu em capacitá-los para que pudessem identificar, através de um diagnóstico, oportunidades e dificuldades daquela localidade. Com isso, houve um intenso diálogo com as comunidades no sentido de identificar soluções a partir da própria capacidade local. Paralelamente, houve um diálogo com as secretarias municipais no sentido de propor soluções e acompanhar esse processo em curto, médio e longo prazos. O resultado foi positivo porque as pessoas começaram a participar, a entender o processo e a tomar ciência do exercício da cidadania. Os setores público e privado entenderam a importância de trazer o cidadão como protagonista.

Apesar do grande desafio de deixar o legado nessas cidades, sem dúvida, é um grande aprendizado para todos. Essa bagagem que está sendo adquirida é essencial para o desenvolvimento do país e pode inspirar outros setores da economia. É dessa forma que a mineração contribui para um país melhor.

M&S   Como você define o atual momento da fundação?

Isis  O ano de 2016 foi desafiador para muitas empresas e também para instituições dedicadas a projetos sociais. Entretanto, a Fundação Vale permaneceu fiel a seu compromisso e, por meio de um trabalho compartilhado com comunidades, a própria Vale e demais atores, promoveu ações estruturantes, otimizando recursos técnicos e financeiros. Chegamos à metade de 2017 mantendo a mesma determinação.

M&S   O que a fundação espera para o futuro?

Isis  Nosso compromisso norteador é com a construção do legado positivo que a Vale busca deixar nos territórios onde está presente por meio do investimento social voluntário e da articulação de parcerias para o desenvolvimento local. A Fundação Vale espera ampliar sua capacidade de atuação frente às demandas e de manter um contínuo aperfeiçoamento de suas tecnologias sociais.

M&S Atualmente, o poder público não consegue suprir todas as demandas da sociedade, e o terceiro setor desempenha um importante papel nesse quesito, oferecendo projetos culturais, educacionais, de geração de renda, entre outros. Como você avalia a atuação das ONGs em geral?

Isis  As ONGs têm um papel muito importante de contribuir para aumentarmos o controle social no Brasil. Além disso, temos buscado parceria com diversas organizações para a realização de ações em formato de coautoria, o que se tornou fundamental para a implementação de projetos estruturantes e aderentes às realidades locais.

 

ISIS PAGY – Perfil
Isis Pagy, nascida no Rio de Janeiro, é economista e trabalhou durante 34 anos no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), tendo atuado como executiva das áreas de inclusão social e cultura. Desde setembro de 2011, é diretora-presidente da Fundação Vale e, também, diretora de direitos humanos e relacionamento com povos indígenas e comunidades tradicionais da Vale.